sexta-feira, 19 de março de 2010

Literatura

Concordamos ampla, total e completamente: não se desata esse nó.
Entretanto, podemos encaminhar um os dois pares de gestos, de ações que podem “afrouxar” o nó. Que tal?
Sem dúvida alguma, convergimos: é preciso tentar algo no princípio da vida intelectual. Quando a criança é criança. Vale dizer, é preciso começar cedo. “É de pequenino que se torce o pepino”.
Imagino que estimular a criança a ler, a se encontrar com sua própria imaginação ao ouvir um livro lido por um adulto, a ver figuras estampadas no papel, que seja, abre o caminho. Oferece a opção. Apresenta um mundo que, dia a dia, mais distante fica de nossas crianças.
No entanto – e aqui a notícia carece de exatidão – é preciso considerar a célebre indagação do samba: “É mais difícil manter ou conseguir?”
Abrir o caminho pode não ser o suficiente. Talvez seja preciso estimular o hábito da leitura por um tempo mais amplo, mais duradouro. Estabelecer uma continuidade no processo de leitura da criança. Conseguir despertar o interesse é o primeiro passo. Manter tal interesse é o passo-decisivo.
Contarei uma historiazinha rápida para tentar ilustrar o que digo:
Há algum tempo, estreamos no Teatro uma peça chamada “A Menininha que Queria Ver o Sol”. O título é grande, sei disso. Bem, fui buscar os cartazes da peça na gráfica. Parei o carro num dos inúmeros faróis da cidade. Um conhecido, 22 anos de idade, ator, viu-me, acenou e perguntou:
– E aí? O que anda fazendo?
Peguei um dos cartazes e mostrei a ele. Ele pegou o cartaz na mão e trouxe sua preguiça à tona:
– “A Menina que Queria Ser...” Ah!, legal! Vou lá assistir. Até mais!

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Música

Pelos finais dos anos sessentas, uma cidade do interior de São Paulo recebeu aquele que é, provavelmente, o maior cantor do mundo de todos os tempos.

O show deu-se num ginásio de esportes. O forro, feito de zinco, do ginásio impossibilitava a mínima chance de uma acústica eficaz para o evento. A aparelhagem de som, alugada especialmente para o show, nem de longe fazia lembrar uma aparelhagem capaz de transmitir a sonoridade ideal para as músicas que seriam executadas.

A orquestra adentrou o palco. Posicionou-se. Começou a introdução da primeira música do show. Uma longa introdução executada pelo naipe dos violinos da orquestra.

Enquanto soavam aquelas doces notas, adentrou o palco um preto baixo, feio, e que aparentava ser um tanto coxo.

As luzes semi-apagas, semi-acesas, confundiam a visão. A platéia não sabia se aplaudia a entrada do cantor.

Repentinamente, o momento de indecisão cessou. Aquele preto baixote, feio e torto abriu a boca e cantou a primeira nota, da primeira música do show: “When...”. A afinação, o timbre, o som daquela nota encantou a todos e silenciou por completo toda a platéia.

Aplaudir, naquele instante, seria um crime.

Todos ficaram silentes para poderem ouvir o restante da frase: “... I fall in love...”

Todos ficaram em silêncio para ouvir a voz de Nat King Cole.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Literatura

Não sei o nome do poeta. Falha lastimável.

Também não exatas as palavras. Falha mais lamentável ainda.

Contudo, o verso define tamanhamente tantas coisas, que o poeta há de me perdoar a ausência do crédito e da precisão dos termos.

Meu salário não aumentou

Quando você me abandonou

Mas o Nescafé dura o dobro

O triplo a lâmina de barbear

Síntese de idéia; uso preciso da linguagem; concisão plena, eficaz. Poesia pura.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Cinema

Gloria Swanson, a atriz, estrela do cinema mudo, andava um tanto esquecida. Cecil B. de Mille, o gigantesco diretor do cinema mudo – e do cinema falado também –, andava um tanto esquecido. Billy Wilder, o mestre do cinema, reuniu-os de um modo absolutamente magistral, genial, sensacional.

Norma Desmond, a personagem interpretada por Gloria Swanson, iludida tanto pela possibilidade de voltar à cena quanto pelo amor que nutria por um escritor fracassado que, acidentalmente, apareceu em sua casa, decide procurar o grande diretor de seu tempo (do tempo do cinema mudo) Cecil B. de Mille para oferecer a ele um roteiro que a traria de volta à cena, de volta à Glória.

A ex-diva pede ao motorista para que tire o antigo e desusado automóvel da garagem. Aporta ao banco de trás o roteirista (brilhantemente interpretado por William Holden) e ruma para um dos grandes estúdios de Hollywood. Um dos muitos estúdios que dela se esqueceram.

O porteiro do estúdio, deslumbrado com a visão da antiga deusa das telas, abre, incontinenti, o portão. O chamativo automóvel conduz Norma Desmond à porta do estúdio onde está a filmar o grande Cecil B. de Mille (que, no filme, interpreta a si mesmo).

Ela adentra o estúdio. Ninguém a conhece, ninguém sabe quem ela é. Menos o grande diretor. Ele vem a ela. Atende-a, trata-a como a deidade viva que ela é. Olha para ela com o olhar de admiração do passado misturado à compaixão do presente. Promete ler o roteiro que ela traz a ele. Despede-se. Pergunta, asperamente, quem a trouxe ali. Ela não merecia tal exposição! Um funcionário esclarece: precisavam de um automóvel antigo para as filmagens de um filme qualquer. O grande diretor ordena que aquilo não mais se repita. O espectador sabe: o tempo passa. Por vezes nem mesmo a glória fica.

Semana que vem: Dançando no Escuro.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Teatro

Uma afirmação polêmica. Mas, verdadeira!!!

William Shakespeare, o maior escritor da história da humanidade, é péssimo dramaturgo.

A turba se levantará contra a afirmação, gritando:

– Mas, como??? Se ele escreveu as 35 peças mais lindas de todos os tempos?!?

Serenamente, direi:

– Verdade. No entanto, escreveu-as para a Literatura, não para a dramaturgia.

Ou, por acaso, passou-nos despercebida a ambientação, por exemplo, do Terceiro Ato de Macbeth?

A rubrica da CENA I: Forres. Um aposento no palácio.

A rubrica da CENA II: Um outro aposento no palácio.

A rubrica da CENA III: Um parque, com uma estrada que conduz ao palácio.

A rubrica da CENA IV: O salão de banquetes do palácio.

A rubrica da CENA V: No pântano.

A rubrica da CENA VI: Em algum lugar da Escócia.

O que sucede a CENA VI? A abertura do Quarto Ato.

A rubrica da CENA I, do Quarto Ato: Uma caverna na zona do pântano. No centro, um caldeirão fervendo.

O que antecede o Terceiro Ato? A CENA IV do Segundo Ato.

Rubrica: Em frente ao castelo de Macbeth.

Agora, me respondam os contendores: que tamanho de palco é esse que prevê tais rubricas? Quem era o cenógrafo de Shakespeare?

Nada disso. Shakespeare escreveu para a Literatura. Ela, para sempre, agradece.

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Futebol

A Organização da Copa do Mundo de 1954, com o intuito de manter as grandes equipes por mais tempo na competição, estabeleceu um regulamento absolutamente esdrúxulo para o torneio: as 16 equipes seriam divididas em 4 grupos. Cada grupo teria 2 cabeças-de-chave, que não poderiam enfrentar-se. Desse modo, supostamente, os times de maior tradição passariam às quartas-de-final e a primeira Copa do Mundo do pós-guerra a ser disputada na Europa-do-pós-guerra teria um sucesso maior.

Tentativa frustrada. Mesmo privilegiadas, Turquia, Itália e França caíram logo na primeira fase.
A seleção brasileira estreou com uma goleada sobre o México (5 x 0). Como cabeça de chave, não enfrentaria a França, que perdera na estréia para a Iugoslávia. Desse modo, Brasil e Iugoslávia precisavam apenas do empate para se classificar para a fase seguinte. A Iugoslávia sabia disso. O Brasil, não.

Os dirigentes da CBD não conheciam o regulamento e, portanto, não informaram os jogadores do privilégio de jogar pelo empate. No dia 19 de junho, Castilho; Djalma Santos e Pinheiro; Brandãozinho, Bauer e Nilton Santos; Julinho, Didi, Baltazar, Pinga e Rodrigues entraram em campo para vencer. Aos 3 minutos do segundo tempo, Zebec abriu o placar para a Iugoslávia. Aos 24 minutos, Didi empatou. Nosso time foi para cima do adversário. Atacava sem cessar. Corria a plenos pulmões.

Os iugoslavos sinalizavam para os jogadores brasileiros para que diminuíssem o ritmo da partida, afinal, o empate classificaria a ambos. Sem compreender as sinalizações, os brasileiros jogavam como se fora, aquela, a última partida da seleção na Copa. Não conseguiram o segundo gol.
Ao final da partida, deixaram o gramado chorando pela “desclassificação” do time. Somente foram informados do equívoco no vestiário.

Pouco adiantou. A desorganização dos dirigentes desgastou o time, que perdeu para a Hungria por 4 x 2, caindo nas quartas-de-final da Copa.