Meu carro cinza se emparelha com um carro vermelho no farol. Os vidros abertos do carro vizinho socializam o que ele ouve em seu rádio. Imediatamente lembro-me do conto “A Igreja do Diabo”, de Machado de Assis, sobre o qual falamos ontem.
A moça, gritando notas agudas, passeando sinuosamente por melismas intermináveis, proclamando palavras-de-ordem acerca de uma tal “obrigação” que todos teríamos de “aderir” ao “Senhor”, durante aqueles 30 segundos de convivência forçada, deixou-me zonzo.
Não me contive. Abri a janela do meu carro e perguntei ao rapaz que, não apenas ouvia, mas também balançava a cabeça ao som do compasso da “música”.
– Moço, que “música” é essa?
– É Gospel!
– O quê?
– É Gospel!
– Ah!, Valeu!, Obrigado pela informação!
Gospel. “Gospel”, a contrição da expressão verbal norte-americana “God Spell”: “Deus fala”.
Deus fala... Daquele jeito? Gritando ensandecido, multiplicando melismas insuportáveis que deterioram a melodia, proclamando palavras-de-ordem contra mim??? Deus me livre!
Pensei que perto de Deus só houvesse o Silêncio...
sexta-feira, 27 de novembro de 2009
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